O que queremos ver na ExpoRevestir 2023

Neuroarquitetura em alta: novas coleções devem primar pelo bem estar físico e mental de seus clientes

Por Joyce Diehl

 

Todos os anos escrevo – e mostro – o que vai ser destaque na Expo Revestir 2023. Este ano, faço o caminho contrário em termos de pensamento: o que quero ver (ou melhor, queremos) na ExpoRevestir. Ou melhor: o que nela será mostrado em termos de revestimentos, louças, metais, entre outros, que vem de encontro o tema da vez, que vem sendo muito discutido pela sua grandeza – a Neuroarquitetura.

Seperti Mimpi, do arquiteto Leandro Sumar na CasaCor Santa Catarina 2022

 

 

E porque Neuroarquitetura?

Modismos à parte, esse tema tem sido foco de estudos, provando como os espaços – e tudo o que existe dentro deles –  interferem em nossas sensações, em nossa percepção sobre eles e, por inter-relação, em nosso bem-estar e até humor. Basicamente – muito basicamente – Neuroarquitetura é a aplicação dos estudos de Neurociência em Arquitetura. Ou o estudo que analisa os impactos do ambiente físico no comportamento humano. Ou ainda, que considera a arquitetura como fator ativo e influente em nosso cérebro.

Nunca ouviu falar?

Nem precisa: pense  em um lugar sem conforto térmico, onde sentou muito frio ou muito calor. Ou sem conforto  acústico, onde não conseguia entender o que a outra pessoa falava e/ou saiu porque era “barulhento demais”. Ou ainda lugares onde você entrou e o definiu como “gelado”, ou “caótico”. Ou, ao contrário, e com sorte, “reconfortante”, “aconchegante”, ” com um cheiro muito bom”(pode até ser jogada de marketing olfativo).  Agora imagine – ou relembre – como você se sentiu em relação a ele, muitas vezes perdendo o foco inicial no que tinha para fazer ou se sentindo “abraçado”.  E, não, não falo de estética e gosto que, sim, podem afetar nosso senso crítico, que também é importante.  Falo de afetar emocionalmente e, consequentemente, fisicamente.

Certo, você já ouviu algo por ai. Por exemplo: o uso de cores nos ambientes. Como a cor vermelha. Se por um lado anima um casal, ou alguém tímido ou até depressivo, podendo ser usada, em doses homeopáticas, em ambientes onde precisamos melhorar o ânimo das pessoas, por outro, libera adrenalina em nosso corpo, podendo alterar nosso batimento cardíaco, desencadear discussões e até briga. Pois é: estudos indicam que ver vermelho antes de um teste cognitivo tende a diminuir a performance. Ou seja: na presença dele, a gente perde o foco, raciocina menos. Pense no efeito disso em uma sala de espera de consultório médico de cardiologia. Ou numa sala de aula para adolescentes! é tudo uma questão de dose. E, sim, você leu dose: como diz o ditado, entre o remédio e o veneno, existe ela.

A isso se chama cromoterapia, ou terapia das cores, que consta da relação das principais terapias complementares reconhecidas pela OMS (Organização Mundial da Saúde) desde 1976 e muito usada na medicina alternativa, está aí para provar a melhoria ou cura por meio do uso correto delas. Como tons de azul e verde para acalmar (excelentes para salas de espera e hospitais, mas não só elas), de amarelo para “radiar o sol” e trazer ânimo, inovação, foco e criatividade à sua equipe de trabalho – e, porque não, em pinceladas, acordar os ambientes hospitalares? Ou o laranja, muito usado em restaurantes e lanchonetes – principalmente de fast food – (pense bem, você já deve ter visto!), pois melhora a digestão e traz…fome. Não à toa esse tipo de empreendimento trabalha com essa cor – muitas vezes desde o design da marca.  Usado em um SPAs ou clínicas de emagrecimento não teria o efeito esperado. Por outro lado – e já provado –  cores frias, como o nome diz, refrescam os ambientes, enquanto cores quentes, esquentam. Assim como os tantos tons de cinzas escuro e preto, muito usados em projetos: esquentam a casa (literalmente), mas esfriam a alma… Mas, relaxe: laranja é puro aconchego (assim como comer)…

 

Notou que as cores do ano de 2023/2024 são todas aconchegantes?

 

Calcita Alaranjada, da Suvinil: oferece energia de inovação e conforto aos ambientes por meio de segurança e otimismo.

 

Silêncio de Inverno, da Coral: cor positiva  e natural, deixa os ambientes mais aconchegantes.

 

 

A Suvinil apostou em um laranja em tom terroso – Calcita Alaranjada – estreando a coleção Suvinil Cores da Terra, feita com pigmentação 100% natural. A Coral, através de um criterioso estudo internacional, o Colour Futures, revelou a cor Silêncio de Inverno, um tom esverdeado claro e ao mesmo tempo terroso, “uma opção para fortalecer o contato com a natureza e, principalmente, melhorar as energias presentes no ambiente”. A  Sherwin-Williams trouxe a cor Meu Caminho, cor que transmite simplicidade e empatia. A  Eucatex apostou na Calmaria, que o nome já diz tudo…Note os conceitos: pura neuroarquitetura!

Mas nem só de cores vive a Neuroarquitetura. Como o nome supõe, aplica os pressupostos científicos sobre o funcionamento do cérebro humano nos projetos arquitetônicos, sejam de arquitetura em si ou arquitetura de interiores. Isso porque a composição dos ambientes tem a capacidade de impactar diretamente em nossa rotina, de forma a motivar ou desestimular nossa presença e interação no e com o local.  Tais escolhas podem influenciar nossa reação, nosso humor, nosso comportamento. E mais: podem alterar nosso batimento cardíaco, nossa respiração, nossa percepção sobre o momento. Pode “turbinar” as mentes em lugares de trabalho, concentrar em lugares de estudo, aconchegar em lugares de internação, dar ânimo quando preciso. O que precisamos é , primeiramente, ver o usuário como único, com sua bagagem emocional, suas vivências, experiências anteriores, traumas, quem sabe. Nos colocarmos no lugar do outro para melhor entender o contexto, os cenários, o que foi vivido e o que se deseja viver – a tal Terapia da Empatia, já ouviu falar?

 

Reforma assinada por Beatriz Quinelato em imóvel antigo do bairro Vila Nova Conceição, São Paulo

 

De onde vem esse conceito?

O termo neuroarquitetura surgiu a partir de pesquisas e descobertas do neurocientista Fred Gage e do arquiteto John Paul Eberhard, que juntos foram capazes de atestar que os ambientes possuem poder de transformar certas capacidades e sensações cognitivas do cérebro humano. Segundo Gage, as mudanças no entorno mudam o cérebro e, portanto, modificam o nosso comportamento. Para o bem e para o mal. Você com certeza já ouviu falar em “zonas de descompressão” em empresas e hospitais, áreas verdes, uso de materiais naturais, uso de cores para espaços voltados para a neurodiversidade (Neurociência pura!). Ou, mais especificamente, os estudos de Piaget e Montessori na educação e crescimento das nossas crianças, entre tantos outros. E o “óbvio”, aprendido na faculdade, mas nem sempre lembrado em nossos projetos: conforto térmico, acústico, lumínicio – cujos nomes já dizem tudo. “Tirar” melhor proveito da ventilação e iluminação naturais, do que o entorno tem a nos oferecer, do que a natureza tem a nos inspirar.

Resumindo: “a arquitetura como meio de transcrever os estados de espírito nas formas da construção, humanizando-as e animando-as”, como já teria dito Bruno Levi em sua obra Saber Ver a Arquitetura, de 1996.

 

Escritório da designer Marina Liberman, Vila Nova Conceição, São Paulo

 

Mas, então, o que há de novo?

É o que você vê nas apostas das marcas antenadas (espero que não por marketing, apenas) sob o codinome menos “assustador” (neuro sempre nos remete a problemas!) de biofilia, sustentabilidade, entre outros – a gente que não leu direito, não se aprofundou. De materiais e formas que remetam – e quanto mais próximo da realidade, melhor – à natureza. Pense bem: na natureza, as formas são orgânicas, e tem muito de toque, tons, sons, cheiros, gostos. Ou seja: ativam os nossos sentidos (relembrando: tato, visão, audição, olfato, paladar). E, claro, ativam nossas memórias, experiências, vivências, já que o cérebro se baseia nisso para gostar – ou não gostar –  de algo. E isso acontece o tempo todo! Por isso sempre falei em memórias afetivas, aquelas que estão guardadas em nosso cérebro. Espero que sejam sempre boas!

E sem esquecer os tantos resultados de pesquisas que mostram o quanto ter animais de estimação ou plantas nos ambientes melhora tudo: são uma bomba de endorfina, de dopamina, serotonina…puro amor! Mas isso nem precisava falar, não é?

Por isso, quero ver esse calor, essa empatia nas novas coleções. Muito revestimento que fuja dos brilhos gelados (e escorregadios!), materiais que tragam muito da Terra (aqui, como sol, solo, vegetação, águas, ar) para nós, entre texturas, cores, sensações. Que nos tragam aconchego, bem estar, bom ânimo para tempos em que se é tão (artificialmente?) digital, vidas passadas em telas.  Que tragam um pouco de nossa história, memória, cultura, valores, lembranças, comportamentos, identidade (e é disso que se faz o gosto, não?). E que tragam alternativas que abranjam as mais variadas perspectivas disso, fugindo da pasteurização dos modismos, lembrando que cada ser é único – seja ele quem for.

 

Joyce Diehl para Revestir.com



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